Rodrigo Ogi enxerga o mundo pela lente do realismo fantástico em Aleatoriamente

Foto por Ênio Cesar
Por Paulo Marcondes
Em seu novo disco, todo produzido por Kiko Dinucci, mestre do flow visita temas como precarização de trabalho, violência policial, morte, vida e amor pelo prisma da fantasia
Ogi é indiscutivelmente um dos nomes mais interessantes e importantes do hip hop brasileiro. Com seus três discos lançados até agora, o MC escreveu seu nome no panteão dos deuses do gênero no País. Aleatoriamente chega para reafirmar a posição do cronista da cidade cinza dentro do rap e alçá-lo para o posto de um dos maiores escritores do Brasil. Seu novo trabalho transborda criatividade por todos os aspectos: dos arranjos e beats, feitos por Kiko Dinucci (Metá Metá), às letras e os flows, pensados pelo rapper.
Ao escrever as canções de Aleatoriamente, Ogi convida o ouvinte para ligar a televisão e dar o play em um filme que mescla o surrealismo, o realismo fantástico e o terror. As histórias, tão vivas e bem escritas, parecem tiradas de um livro de contos muito particular e escrito sob medida por ele para trabalhar temas contemporâneos sem esbarrar em clichês panfletários, infantis ou pretensiosos. O resultado disso é uma obra que propõe novas formas de composição, de flow e de pensar o storytelling dentro do rap nacional, uma das marcas mais fortes do gênero desde a década de 1990.
Aleatoriamente é um passeio pela mente ora caótica, ora imaginativa de Rodrigo Ogi. O disco trata das mais variadas questões da atualidade, que rondam, apavoram e instigam as cabeças mais ligadas ao seu redor: da precarização do trabalho em "Rotina" à proximidade da morte em "Peixe", passando pelo questionamento do amor na dobradinha "Cupido" e "Eu Pergunto por Você", o artista se mostra atento ao surreal universo que tem cercado o ser humano nos últimos conturbados anos da nossa existência enquanto sociedade.
Com Kiko Dinucci assinando toda a produção do álbum, o disco soa como uma extensão do trabalho que foi iniciado com o propositivo RÁ!, de 2015, em que Ogi já mostrava sua intenção de se aproximar de gêneros que estão fora do hip hop underground dos anos 90 e 2000. O resultado de seguir este caminho abre um leque de possibilidades: as batidas, que soam quebradas, mais eletrônicas e barulhentas, dialogam com ritmos contemporâneos do País, e pegam a estrada desbravada e pavimentada pelo Company Flow, o Antipop Consortium e outros artistas que ajudaram a desenvolver novas formas de produção dentro do hip hop estadunidense.
Para acompanhar o artista nessa sonoridade brasileira e vanguardista, Ogi conta com participações de nomes que são sucessos de crítica: Juçara Marçal, Russo Passapusso (BaianaSystem), Siba e Tulipa Ruiz, além de convidar para rimar um único rapper, que também habita o panteão dos deuses do gênero com ele e que nos últimos anos vem sendo aclamado dentro da música nacional: Don L. Completam o time Alana Ananias (bateria), DJ Nato PK (scratchs), Nave (produção) e Thiago França (sopros).
Todas as músicas contam com um visualizer feito pelo pessoal da Pó de Vidro Filmes, que se baseou no surrealismo de Dali e Buñuel, em filmes de terror slash e em diversas referências do universo criado por Aleatoriamente para criar uma obra que funciona como uma extensão do álbum e ajuda o ouvinte a acompanhar a mente de Rodrigo Ogi. A direção é de Felipe Larozza, que também assina o criativo ao lado de Daniel Lupo, Patrícia Heit, Victor Ciappina e Vinicius.JPEG.
A foto da capa foi feita pelo parceiro de longa data de Rodrigo Ogi, o fotógrafo Ênio César, que foi até o SESC Pompeia, reduto importante para a cultura paulistana, para criar a arte.

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